E acrescenta: "Percebi que a mesma coisa acontece com muitas pessoas porque o folclore é pensado a partir de uma lógica heterossexual. Certos atributos são dados aos homens, os gaúchos [por exemplo], como força, firmeza e cortejo. Ele é quem conduz. As mulheres, entretanto, são submissas, complacentes".
Uma homenagem a uma heroína aimara
Os questionamentos sociais de Mamaní não se limitam ao mundo do folclore, eles também falam sobre as tendências que dominam a estética global com as quais a “drag” é abordada, uma estética na qual o artista diz estar ligada aos estereótipos das noções de feminino do ocidente.
Sua personagem “drag” é um desvio dessa tendência: inspirada por Bartolina Sisa Vargas, uma líder aimara que se rebelou contra o Império espanhol e posteriormente foi capturada, torturada e assassinada em La Paz, na Bolívia, em 1782, Mamaní presta homenagem a essa mulher andina, a cholita, “uma mulher trabalhadora, chefe de família, que sai para o trabalho todos os dias e tem laços com a família, a comunidade, os antepassados e as tradições”.
Em um episódio do podcast “Relatos Disidentes”, do portal de Salta, VóVè, Mamaní descreve sua personagem: "Eu costumo dizer que empresto meu corpo para Bartolina Xixa. [Uma personagem que] nasceu da urgência de poder pensar em outras formas de fazer folclore, outra forma de entender identidades que cruzam minha própria experiência e que atravessam a experiência de todo um grupo".
Desafiando a construção da masculinidade argentina e a “norma LGBT”
O ativismo e a militância de Mamaní atraem as redes sociais – especialmente Facebook e Instagram – por meio das quais transmitem mensagens provocativas. O melhor exemplo é uma postagem no Facebook que ficou conhecida como o “beijo gay”, e que se tornou viral em novembro de 2018.
O post foi compartilhado durante a partida de futebol entre Boca Juniors e River Plate, com imagens de Mamaní beijando outro homem em frente ao convento San Bernardo, em Salta, enquanto usavam as camisas das equipes rivais e com os dizeres “O Superclássico Beijo Gay”.
Um trecho do texto no post diz: "O superclássico Beijo Gay. Somos negros, somos das favelas, somos do interior da Argentina, somos pobres, não somos o estereótipo de um corpo esguio, somos rostos negados pela colonialismo. Somos gays, empoderados e subalternos, longe do gay ‘clássico’ estereotipado […] Vivemos nossa vida nos espaços e nas memórias que são sempre silenciados pela norma hétero e pela norma LGBT […] Um clássico argentino não é um BOCA contra RIVER, um clássico argentino é ver como nos estigmatizam, nos insultam, nos expulsam, nos odeiam, nos matam".
O post recebeu muitos comentários e todos tipos de reações de apoio, rejeição, ridicularização, admiração, amor e ódio dos usuários. A Global Voices falou com Mamaní sobre o post via WhatsApp:
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