O Sul está longe dos recentes focos de desmatamento e fornece à China mais de um terço das importações brasileiras de soja há mais de uma década. Notamos que a região tem apenas cinco municípios com níveis aparentes, ainda que baixos, de conversão de habitat.
Apesar disso, em 2021, a produção do Sul foi bastante afetada por condições climáticas extremas. Só no Rio Grande do Sul, segundo estado brasileiro que mais exporta soja para a China, a produção caiu 46% devido a uma seca incomum. A região também tem capacidade limitada para expandir a agricultura devido à erosão e fragmentação de terras agrícolas.
Até agora, o Mato Grosso está relativamente livre de tais limitações. Em 2020, o estado contribuiu com 29,27% e 15,49% da produção total de soja e carne bovina do Brasil, respectivamente. Mais da metade dessas commodities produzidas no estado foi exportada para a China naquele mesmo ano. O estado foi responsável, sozinho, por 14% das importações de soja da China e 6,8% das de carne bovina em 2020. Assim, o Mato Grosso desempenha um papel dominante no comércio agrícola sino-brasileiro.
Nossa análise constatou que houve um grau relativamente baixo de conversão de habitat associado às importações da soja mato-grossense em 2018. Apenas dois municípios têm níveis moderados de desmatamento, apesar de o estado estar cercado por três biomas importantes — Amazônia, Cerrado e Pantanal.
Isso explica, em parte, por que o Mato Grosso foi um dos dois estados da Amazônia Legal brasileira a receber financiamento do Reino Unido e da Alemanha por meio do REDD+ Brasil em 2015.
Recomendações para o comércio agrícola entre Brasil e China
A partir de entrevistas com importantes atores do setor e análise documental, descobrimos que o Mato Grosso consegue ter uma sinergia entre a agricultura e a conservação da biodiversidade.
Isso envolve, primeiramente, inovações em regulamentações administrativas, tais como uma abordagem jurisdicional — uma forma de gestão da paisagem dentro de limites claramente definidos e com um alto nível de envolvimento e participação governamental e de outros atores —; o acesso condicional a crédito agrícola; a revitalização de áreas de preservação; o apoio às cadeias alimentares locais e à agricultura familiar. Avanços tecnológicos como a recuperação de terras degradadas, a integração pecuária-floresta e o desenvolvimento de ração animal também desempenham um importante papel.
Contudo, a capacidade de aplicação da lei ainda precisa ser fortalecida para se combater a conversão ilegal de habitat, especialmente nos municípios de Paranatinga e Feliz Natal.
Com base nesses achados, argumentamos que, para promover práticas agrícolas favoráveis ao clima e à natureza e reduzir a volatilidade da cadeia de fornecimento, a atenção deve ser direcionada para as poucas áreas de alto risco, como os seis municípios produtores de soja em Matopiba.
Investidores chineses também precisam concentrar mais esforços nessas poucas áreas de risco como parte de sua estratégia de fornecimento de longo prazo. O desmatamento ligado à carne bovina afeta municípios com mais intensidade e exige mais recursos e coordenação.
Também recomendamos que as empresas chinesas adotem uma abordagem cautelosa ao investir na agricultura e em setores relacionados, incluindo a infraestrutura no Sul do Brasil. Quanto ao Mato Grosso, o GEI considera construtivo o engajamento com o governo local e a indústria e reconhece seus avanços, ao mesmo tempo em que a ajuda a melhorar sua capacidade de governança.
Parceria para cultivar boas práticas
O GEI é uma das primeiras organizações da sociedade civil chinesas a "se tornar global". É a primeira entidade do país a investigar o desempenho ambiental e social das empresas privadas chinesas no comércio de madeira com a África e o Sudeste Asiático, em 2007. Desde então, o GEI já trabalhou em 11 países para lidar com externalidades ambientais associadas ao comércio bilateral.
O GEI trabalhou com sucesso com agências governamentais chinesas, incluindo o Ministério do Comércio, a Administração Nacional de Florestas e Pastagens e o então Ministério de Proteção Ambiental para introduzir uma série de diretrizes para regulamentar os investimentos e as atividades comerciais de empresas chinesas no exterior, incluindo as Diretrizes para a Proteção Ambiental de Investimento e Cooperação no Exterior de 2013.
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