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A eleição aleatória, o G1000, e a deliberação para mudar Madrid

É a eleição aleatória de representantes essencial para revitalizar a democracia? Mil madrilenos escolhidos aleatoriamente foram convocados pelo G1000 de Madrid para reflectir sobre a cidade que querem. English Español

Yago Bermejo Abati
22 Março 2017
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Inteligência colectiva para a democracia. MediaLab-Prado. Jornada XII(30.11.2016). David Fernández/LM/Flickr. Alguns direitos reservados.

Queremos democracia real e isso implica abrir as portas das instituições. Desde as últimas eleições municipais muitas cidades decidiram potencial a participação cidadã. A diversidade de processos e a vontade de experimentar foram extraordinárias. As novas plataformas baseadas no software de livre de participação Consul, como Decide Madrid ou Decidim Barcelona, foram replicados mais além das nossas próprias fronteiras, abrindo possibilidades antes inimagináveis à participação directa e distribuída através das redes.

A ultima votação vinculante de iniciativas cidadãs através dum processo de voto seguro em Madrid põe a cereja em cima destes processos, aproximando as cidades da mudança a países como a Suíça onde a democracia directa já está estabelecida desde há anos. Paralelamente, dezenas de processos de participação presencial e mista articularam-se por todo o lado. Alguns exemplos importantes seriam “A Porta Aberta na Corunha”, o “Plano de Actuação Municipal em Barcelona” e a experiência mais recente e estrutural em Madrid: o inicio dos Fóruns Locais, os espaços de referencia distritais para articular a deliberação local.

Quase dois anos depois desde as eleições municipais, precisamos de fazer balanço e perguntarmo-nos até que ponto todos estos processos estão a ser suficientemente efectivos, inteligentes e inclusivos. Não pretendo abordar todos os pontos chave neste breve texto, mas apenas um deles: a inclusividade. Está-se a conseguir que dezenas de milhares de pessoas participem em processos deliberativos, processos mais ambiciosos que emitir um voto ou um apoio. Numa grande cidade como Madrid, ainda sendo muita gente, não supera 1% da população. Que tipo de cidadãos participam? Temos homens e mulheres de todas as idades, classes sociais e ideologias? Estão as minorias ou a população em risco de exclusão representados? Qual é a amostra participativa? Como podemos tentar melhorar os processos de participação para maximizar a diversidade dos participantes?

A estatística diz-nos que se escolhemos um número suficiente de elementos aleatoriamente podemos obter uma amostra representativa do conjunto, quer dizer uma amostra que represente a diversidade da população. Se bem que esta ideia é fácil de implementar nas ciências exactas quando lidamos com seres humanos torna-se numa tarefa mais complexa. Não podemos tirar as pessoas das cabines de voto. Como muito, podemos contactá-las pelas ruas ou através duma guia de telefones. E ainda conseguindo abordá-la, podem negar-se a participar. As razões podem ser várias e podem chegar a quebrar a representatividade da amostra. Felizmente os profissionais que realizam as sondagens dispõe de técnicas que ajudam a contrariar este efeito: introduzem quotas baseadas em critérios chave como o lugar de residência, idade, género, etc…. Desta forma dedicam mais esforço e recursos aos perfis mais difíceis de encontrar ou mais difíceis de envolver.

Voltar à raiz da democracia

Os antigos gregos introduziram há já muitos séculos os métodos aleatórios de selecção democrática. Chegaram desta forma a designar a maioria dos cargos relevantes da estrutura política das suas cidades. Pelo contrário, nos nossos estados modernos isto já quase que não existe, tal como é o caso do júri popular. Que podem aportar as pessoas escolhidas aleatoriamente? De acordo com uma nova corrente de pensadores e actividades, muito.

Há apenas umas semanas o filósofo e escritor David Van Reybrouck esteve a apresentar pelo nosso país o seu novo livro Contra as Eleições. No mesmo destaca a valor da deliberação em contraposição à votação e dos cidadãos frente ao parlamentário profissional. Sublinha também diferentes iniciativas nas que juntou centenas de cidadãos contactados de forma aleatória. É o caso da tentativa de reforma constitucional da Islândia e da do evento G1000 nascido na Bélgica e exportado mais tarde para a Holanda.

No dia 4 de Março de 2017 mais de mil madrilenos foram convocados pelo G1000 no Palácio de Cibeles da Câmara Municipal de Madrid. Estes cidadãos foram seleccionados de forma aleatória através dum processo de contacto presencial em mercados, polidesportivos e centros de saúde dos 21 distritos de Madrid. O contacto incluiu uma sondagem para garantir que a amostra de cidadãos fosse demograficamente representativa da cidade. Antes do encontro, David Van Reybrouck, um dos fundadores do G1000, enviou uma mensagem de apoio ao G1000 Madrid: “Numa época de comunicação e informação, as pessoas têm algo que dizer. O G1000 oferece aos cidadãos comuns a oportunidade de falar sobre a sua ira e sobre os seus sonhos. Depois duma dúzia de reuniões do G1000 na Bélgica e na Holanda, Espanha celebrará a sua primeira Cimeira Cidadã G1000 em Madrid. Espero que consiga juntar os cidadãos. Não tens que estar de acordo para ter uma boa conversa”.

Durante o encontro os cidadãos distribuíram-se em grupos de dez pessoas, no máximo, nos quais se reflectiu e debateu a cidade. Ao finalizar a manha tinham formulado dezenas de protestas de forma conjunta para o processo de orçamentos participativos para o qual estão destinados 100 milhões de euros. Gente comum que nunca tinha participado conseguiu subir as propostas a decide.madrid.es, a nova ferramenta de software livre de democracia directa da Câmara Municipal, compartilhando as suas reivindicações com toda a cidade e conseguindo grande aceitação.

Desde o ParticipaLab, o Laboratório de Inteligência Colectiva para a Participação Democrática, desde Medialab-Prado esperamos que esta iniciativa abra a porta a novas estratégias para introduzir a aleatoriedade e o sorteio da deliberação democrática.  

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