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O debate sobre uma renda básica universal perde força na Colômbia

Governos ao redor do mundo vêm aprovando renda emergencial para os mais vulneráveis. Mas na Colômbia, o debate está sendo empurrado.

María Fitzgerald
8 Julho 2020, 4.02

"Se nos dessem alguma ajuda, não teríamos que ter nos mudado. Mas com fome, o que poderíamos fazer, mija (minha filha)", diz Claudia. Indígena da etnia Wayúu, Claudia chegou em Bogotá após ser deslocada pela violência que tomou conta da Guajira. Na capital, antes da pandemia, ela sobrevivia vendendo artesanato nas ruas: mochilas, braceletes e brincos. O que conseguia juntar, ela dividia entre si, seus filhos e netos, e o restante enviava à sua comunidade na costa atlântica. No entanto, quando começou a quarentena, perdeu seu único meio de subsistência: "se o governo nos desse uma renda, não estaríamos nessa situação".

Desde o início da pandemia, a precariedade de bens e recursos tem marcado a vida de muitos habitantes na Colômbia. As taxas de pobreza e desemprego aumentaram, e os panos vermelhos – símbolo da fome nas principais cidades – apareceram nas janelas. No Senado, a resposta da Renda Básica Universal surgiu como uma alternativa clara para reduzir drasticamente o número de possíveis infecções, impedindo que as pessoas mais vulneráveis saíssem às ruas. Esta medida também ajudaria a aliviar a saturação dos hospitais que, em cidades como Bogotá já têm 63% dos leitos de UTI ocupados. No entanto, a discussão foi adiada, o que continua a manter milhares de famílias em situação precária.

"Mamita, eu tenho asma, não estou interessada em sair e me expor. Porque quem vai pagar pela minha saúde?" diz Claudia. Ela, que já tem 74 anos, chegou a Bogotá há 30. Claudia teve que fugir da Guajira quando que sua filha foi estuprada, torturada e morta por paramilitares, sob o comando de Jorge 40. Quando tentou esclarecer o que havia acontecido, recebeu ameaças: "era isso que faziam com as meninas lá na costa; qualquer uma que negasse dormir com um desses caras acabava assim. E foi isso o que aconteceu com a minha filha".

Desde o início da pandemia, a precariedade de bens e recursos tem marcado a vida de muitos habitantes na Colômbia

Quando chegou à cidade, não teve outra escolha a não ser trabalhar com comércio de rua. Ela e seus filhos costumam andar pelo centro de Bogotá vendendo o que lhes é enviado de Guajira. Mas com a pandemia, essa alternativa foi impossibilitada. Hoje, Claudia não sabe como vão sobreviver o restante da quarentena: "as poucas coisas que estávamos vendendo, mamita, estão aqui guardadas".

Com o início da quarentena nos países latino-americanos, a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), promoveu o projeto de uma renda de emergência durante a quarentena, que no futuro poderia se tornar uma Renda Básica Universal. Com este projeto, a CEPAL projeta uma renda média de US$ 143 para aproximadamente 215 milhões de pessoas. Em uma entrevista ao El País, Alicia Bárcena, representante da CEPAL, disse que "o objetivo estratégico a longo prazo deve ser uma renda básica universal. Seria libertador: daria liberdade às pessoas de evitar situação precária de sobrevivência. E devemos avançar gradualmente em direção a ela".

Este debate chegou à Colômbia, impulsionado em grande parte pela oposição. Uma das representantes na Câmara, María José Pizarro, disse ao democraciaAbierta que "garantir uma renda básica para os colombianos é essencial para mitigar os impactos desta emergência, e pode se tornar a ferramenta para nos ajudar a tirar milhões de colombianos da pobreza". Entretanto, segundo Pizarro, há um setor político que não está interessado na realização deste projeto e, portanto, se dedicaram a adiar a discussão.

Em 20 de junho, a revista Dinero relatou que o debate havia sido interrompido na Terceira Comissão do Senado. Isso implica, em termos gerais, que não foi apresentado como um projeto de lei, e que primeiro terá que se tornar parte do debate geral na Câmara.

"O que aconteceu no Senado é que eles atrasaram mais a discussão. Isso vai levar algum tempo", diz Camila Moncada, uma cientista política com mestrado em políticas públicas da Universidad de los Andes. Moncada disse que a comissão encarregada de propor o tema para debate, que deveria ter promovido uma discussão forte, está sendo velada pelo interesse de setores políticos que não querem permitir a materialização de renda básica: "Não é que eles tenham derrubado o debate, é que eles nem se preocuparam em considerá-lo", disse.

Enquanto no Senado a discussão continua sobre a possibilidade de criar, ou não, a Renda Básica Universal, a mercadoria na casa de Claudia continua se acumulando: "Como posso dizer a eles para para de enviar mercadoria, se lá eles estão pior do que nós aqui?"

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