Portanto, não podemos descontextualizar o momento e a oportunidade política que as plataformas escolheram para censurá-lo. O fizeram quando Trump já estava de saída e no dia em que ficou definido que os comitês legislativos responsáveis pela regulamentação das grandes corporações digitais serão presididos por democratas.
Não será a primeira ou a última vez que as decisões que afetam o mundo são tomadas nos Estados Unidos, tendo sua política interna em mente. Se o Facebook e o Twitter se tornarem os guardiões do que é aceitável ou censurável, as consequências para a democracia serão muitas.
De que lado teriam estado em novembro de 2019 na Bolívia? Quem deve ser censurado, o destituído presidente Evo Morales ou o secretário-geral da OEA, Luis Almagro? Qual seria o medidor democrático dos proprietários do Vale do Silício?
A política democrática requer um consenso contingente, muitas vezes traduzido em instituições, e vive em uma fragilidade sempre preocupante – que fica mais evidente quando governam setores autoritários. A solução não é delegar a gestão da democracia às corporações.
Além disso, Trump não nasceu de um repolho. Sua transformação de um empresário bilionário em político foi parcialmente fabricada nas redes sociais, com sua lógica algorítmica, bolhas ideológicas onde todos se sentem maioria e nas quais certas mentiras podem assumir o status de verdade com menos dificuldade.
A sociedade americana, rica em grupos de supremacia e teorias da conspiração, foi um terreno fértil para essa lógica de redes permitir que o que circulava por meio de pequenos grupos segmentados fosse replicado, massificado e articulado. Tudo isso seria impensável sem o Google, o Facebook e o Twitter, mas também sem a Fox News, peça central da narrativa da extrema direita americana.