Essa realidade ficou ainda mais fragilizada pela pandemia de Covid-19, que fez com que a Colômbia implementasse rigorosas quarentenas nacionais, reduzindo assim o acesso das mulheres a serviços que atendem casos de violência, incluindo o tráfico, ao mesmo tempo em que grupos armados intensificaram suas atividades ilegais.
Embora o tráfico seja uma violação que pode afetar tanto homens quanto mulheres, na Colômbia, aproximadamente 85% dos casos identificados envolvem mulheres e meninas. Mulheres venezuelanas são atraídas para a Colômbia com a promessa de empregos, mas quando chegam encontram-se em situação de exploração sexual e/ou trabalho doméstico forçado.
Apesar de um marco legal que proíbe e pune o tráfico de pessoas, faltam dados a respeito — e os que existem variam significativamente entre as agências que os coletam. Assim, as vítimas do tráfico permanecem nas sombras, sem acesso à proteção de que necessitam.
Além disso, os relatórios mostram consistentemente que, embora a Colômbia tenha protocolos para proteger as vítimas, o acesso à justiça é limitado. Um relatório da Women's Link, que identificou casos de tráfico entre 2011 e 2016, afirma que dos 908 casos abertos, apenas 52 resultaram em condenações.
O caso de Yolanda
Neste contexto complicado, a Women's Link identificou o caso de Yolanda, uma venezuelana vítima de tráfico de pessoas para exploração sexual, representada pela Women's Link Worldwide (WLW).
Yolanda foi capturada na Venezuela e transferida para a Colômbia junto com seu companheiro e duas de suas filhas. Ao chegar a uma cidade fronteiriça colombiana, a pessoa que lhe havia oferecido um emprego como vendedora de bebidas quentes lhe informou que tanto ela como uma de suas filhas se tornariam prostitutas. Durante o tempo em que permaneceu na casa de um de seus captores, ela e sua filha mais velha foram vítimas de violência e assédio sexual.
Após a fugir, Yolanda procurou autoridades públicas como o Ministério Público e a prefeitura local para solicitar medidas de proteção e assistência às vítimas de tráfico de pessoas previstas na lei colombiana.
No entanto, o Ministério Público determinou que Yolanda foi vítima de indução à prostituição e não de tráfico de pessoas. Consequentemente, a comissão municipal de combate ao tráfico da cidade em que se encontra determinou que Yolanda não poderia ser considerada vítima de tráfico e, portanto, não tinha direito a medidas de proteção e assistência.
O caráter condicional da assistência e proteção de Yolanda à investigação criminal e a falta de identificação com base em provas, bem como as irregularidades no processo de assistência, constituem algumas das deficiências da política antitráfico na Colômbia. Apesar de a Corte Constitucional ter indicado que a denúncia criminal não é um requisito para ativar a via de assistência e protecção, as entidades públicas encarregadas de coordenar a referida via, como tais como prefeituras locais ou gabinetes de governo, continuam a exigir requisitos relacionados à investigação criminal, como aconteceu no caso de Yolanda. Esta situação decorre da concepção generalizada de que a abordagem criminal, ou seja, a perseguição dos perpetradores, prevalece sobre a abordagem dos direitos humanos quando se trata da situação das vítimas de tráfico.
Com o apoio do Women's Link, Yolanda iniciou uma longa luta jurídica para obter acesso à proteção a que ela e sua família tinham direito. Após várias instâncias judiciais negarem seus direitos, o processo chegou ao Tribunal Constitucional, que selecionou o caso no final de 2019 e proferiu uma decisão final em outubro de 2021, a decisão T-236 de 2021.
Por que essa decisão é importante?
A decisão da Corte tem um impacto que vai além do caso específico de Yolanda e sua família, porque adota uma abordagem baseada nos direitos para exigir que o Estado colombiano promova mudanças estruturais para melhor proteger as vítimas do tráfico.
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