democraciaAbierta: Opinion

Barbados está abandonando suas algemas coloniais. Agora deve promover mudança verdadeira

No 55° aniversário de sua independência, o país caribenho remove a rainha como chefe de Estado

Kareem Smith
30 Novembro 2021, 12.01
Mia Mottley foi criticada por envolver o príncipe Charles na celebração da república
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PA Images/Alamy Stock Photo

Barbados está nos estágios finais de concluir sua transição para um sistema republicano de governo. Hoje, 30 de novembro, data que marca o 55º aniversário de sua independência da Grã-Bretanha, a rainha britânica deixa de ser o chefe de Estado do país. A palavra "real" também será removida dos nomes das instituições e elas não terão mais a insígnia da rainha Elizabeth II. A minúscula ilha caribenha terá sua primeira presidente eleita, Sandra Mason, representante da luta barbadiana pela autodeterminação e cujo mandato não durará uma vida.

Para muitos ao redor do mundo, o afastamento da monarquia britânica é uma separação madura e progressiva do antigo mestre colonial da ilha. Para a população de Barbados de pouco menos de 300 mil, é um período extremamente significativo que põe fim a mais de 400 anos de domínio britânico, que incluiu séculos da forma mais desumana de comércio de escravos.

Barbados foi “a primeira ‘sociedade escravista negra’ da Grã Bretanha colonial. A sociedade mais sistemicamente violenta, brutal e racialmente desumana da modernidade”, observa Hilary Beckles, historiadora barbadense e presidente da Comissão de Reparação da Comunidade do Caribe (CARICOM).

Muitos de meus colegas jovens barbadianos veem 30 de novembro como o início de uma nova jornada nacional. Na verdade, muitos de nós não nos contentamos com o simples símbolo de ter um chefe de Estado barbadense. Em vez disso, vemos a necessidade de sair de uma ordem que por séculos investiu em um conceito de soberania hereditária que nunca foi consistente com nossa identidade. Como soberana, a monarca britânica possui todas as terras do Estado, edifícios, equipamentos, empresas estatais, os direitos autorais sobre as publicações do governo e emprega todos os funcionários públicos.

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Três séculos de atrocidades

A maioria dos barbadianos com idades entre 18 e 35 está ciente dos principais detalhes do comércio transatlântico de escravos. Como propriedade da burguesia britânica, nossos ancestrais labutaram depois de serem sequestrados de suas casas na África Ocidental, destituídos de sua dignidade e forçados a trabalhar em plantações de açúcar em condições exaustivas.

Esta forma bárbara e brutal de tráfico humano, assassinato, tortura e estupro tornou ricos os perpetradores desses crimes hediondos. Eles acumularam enormes fortunas, que estabeleceram as bases para uma riqueza multigeracional. Os jovens barbadianos agora sabem que, ao longo do tempo, aquelas fortunas ilícitas foram consideradas tão gloriosas pelos escravistas que a ilha era comumente referida como "Pequena Inglaterra" e considerada um modelo quase perfeito para o comércio.

Esse foi apenas o início de um período de atrocidades não ditas, que durou mais de 300 anos. Ela continuou muito além da abolição do comércio transatlântico de escravos, em 1807, e da abolição formal da escravidão pelas assembléias coloniais no Caribe, em 1838.

Como propriedade da burguesia britânica, nossos ancestrais foram forçados a trabalhar em plantações de açúcar em condições exaustivas

O comércio de escravos foi, é claro, endossado pela família real britânica. Junto com outras famílias britânicas ricas, a realeza britânica desempenhou seu papel nesta forma mais desprezível de capitalismo. O Barbadian, um jornal de Bridgetown em atividade entre 1822 a 1861, publicou uma proclamação de 1824 pelo rei George IV, em que afirmava que a "População Escrava ... não será merecedora de nossa proteção se não apresentar toda a submissão às leis, assim como a obediência devida a seus Mestres”.

O legado da escravidão é o subdesenvolvimento e a dependência. Essa dependência era tão profunda que quando a Grã-Bretanha respondeu aos rendimentos decrescentes de seu projeto colonial com o "presente" da independência, Barbados foi compelido a aceitar a monarca britânica como sua. Também herdamos o sistema de governança de Westminster, o Conselho Privado do Reino Unido como tribunal de apelação e muitas leis antigas, incluindo a criminalização de relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo.

Depois de ganhar a independência, Barbados criou sistemas que poderiam ajudar a elevar o cidadão negro médio, que invariavelmente descendia de ancestrais escravos. Todos tiveram acesso à educação, saúde e alimentação escolar gratuita. Um esquema de seguridade social foi estabelecido sob o primeiro ministro Errol Barrow.

Mesmo assim, Barbados manteve alguma admiração pela família real britânica nos anos imediatamente após a independência. Isso agora diminuiu, à medida que os jovens barbadianos aprendem sobre sua história e a das Índias Ocidentais. Na verdade, muitos até questionaram a decisão da primeira-ministra Mia Mottley de ter o príncipe Charles como convidado de honra nas celebrações da nossa república. Um jovem advogado tuitou: “Ele vem trazendo indenização?”

Há uma aceitação esmagadora de que agora é a hora de iniciar um processo de reforma social mais profunda

O que a família real britânica representa é o que vem nas mentes dos jovens de Barbados quando pensam sobre a verdadeira autodeterminação. Cinquenta anos depois da independência, uma classe de barbadianos mais educados e conscientes é capaz de identificar as deficiências gritantes de uma sociedade que sofreu 400 anos de opressão.

Há uma aceitação esmagadora de que agora é a hora de iniciar um processo de reforma social mais profunda, de escrever uma nova constituição e consagrar um sistema de governança e ordem social que reflita quem somos como povo e aborde as lutas históricas que nos definem.

É por isso que o plano de 10 pontos delineado pela Comissão de Reparações da CARICOM faz sentido. Ele oferece um “caminho para a reconciliação, verdade e justiça” para as vítimas do tráfico de escravos, começando com um pedido de desculpas completo e formal de vários governos europeus. Também sugere planos de reabilitação psicológica, cancelamento de dívidas, erradicação do analfabetismo e transferência de tecnologia dos ex-senhores de escravos do Caribe.

Dito isso, a próxima transição para Barbados também gerou alguns questionamentos. Alguns acadêmicos e comentaristas duvidam que a mudança para uma república seja de alguma forma significativa ou revolucionária. Eles argumentam que essa medida já foi tomada por pelo menos cinco países da CARICOM – Haiti, Dominica, Trinidad e Tobago, Guiana e Suriname.

Os céticos também dizem que, para todos os efeitos, Barbados tem certo controle de seu próprio destino desde a independência, em 1966.

Em 2003, por exemplo, o país substituiu o comitê judiciário do Conselho Privado com sede em Londres pelo Tribunal de Justiça do Caribe, localizado em Trinidad, como seu tribunal de última instância. Mas todo o seu sistema parlamentar, que foi adotado de Westminster, continua a conferir um tremendo poder ao primeiro-ministro. Há poucos freios e contrapesos no gabinete e poucas oportunidades para o tipo de engajamento cívico necessário para a próspera democracia participativa desejada por muitos barbadianos. Como muitos outros, esperava que a grande maioria parlamentar de Mottley a tivesse compelido a instituir mudanças significativas nas estruturas de governo colonial.

Muitos questionaram a decisão de ter o príncipe Charles como convidado de honra nas celebrações da república. 'Ele vem trazendo indenização?'

Existem também alguns conflitos internos morais entre liberais e conservadores sobre o quanto da velha ordem, em última análise, precisa mudar. Os liberais estão convencidos de que muitas das rígidas exigências da religião imposta pelos europeus são responsáveis ​​por atitudes subservientes à escravidão e ao colonialismo. Os tradicionalistas, por outro lado, abominam até o mais leve sentimento "anti-Deus". Humanists Barbados, uma organização de direitos humanos, está pedindo a remoção de todas as referências a Deus na legislação da ilha, a começar pela Constituição, que reconhece o "primado" de Deus. O grupo também está fazendo lobby para a eliminação das orações na escola e a adoção de direitos para a comunidade LGBTQ.

Também há uma discussão importante em curso sobre até que ponto o uso de punição corporal em lares e instituições de ensino fundamental e médio representa uma forma desumana de punição herdada do sistema escravista. Em um nível mais alto, a retenção da pena de morte por homicídio se enquadra diretamente nessas discussões.

Mas, por enquanto, Barbados está passando por um momento de grande empolgação, embora infelizmente ocorra em meio a um período de dificuldades econômicas para o povo da ilha, que depende fortemente das fortunas de uma indústria de turismo que continua a ser prejudicada pela crise da Covid-19. O país está em sua onda mais letal do vírus desde o início da pandemia, o que levou à introdução de restrições e toque de recolher à meia-noite. Os cinco dias de celebrações planejados para esta importante ocasião serão, para muitos, vividos em casa.

No futuro imediato, algumas das velhas formas permanecerão mesmo depois que a transição republicana estiver cerimonialmente concluída. Mas há uma obrigação moral para o governo e o povo de Barbados de se submeterem a um longo período de diálogo sobre o tipo de país que desejamos para nós, nossos filhos e todas as gerações seguintes.

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Martin Rosenbaum Author of ‘Freedom of Information: A Practical Guidebook’; former BBC political journalist
Jenna Corderoy Investigative reporter at openDemocracy and visiting lecturer at City University, London
Chair: Ramzy Alwakeel Head of news at openDemocracy

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