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Jesús Abad Colorado: a dor e a esperança do conflito colombiano

Entrevista com o fotojornalista: "O que faço é... dar nome aqueles que muitas vezes vi chorando, mas que também são os que vejo levantar-se uma e outra vez”. Español English

Beverly Goldberg
11 Outubro 2019, 7.43
Jesús Abad Colorado durante o Festival Gabo em Medellín.
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Andrés Bernal Sánchez. Todos os direitos reservados.

O conflito armado na Colômbia não é uma história estranha para o fotógrafo e jornalista Jesús Abad Colorado. Nascido em uma família de camponeses de Antioquia Abad viveu lado a lado com violência desde muito menino.

Seu avô, José María Colorado, e seu tio Germán, foram baleados por serem liberais na cidade conservadora de San Marcos. Pouco depois, sua avó, Maria Dolores González, morreu de tristeza A lembrança está congelada no tempo através de uma foto que mais tarde mostraria a importância da fotografia na preservação das histórias daqueles que viveram a guerra da Colômbia.

Vários outros primos foram vítimas de desaparecimento forçado e sequestro pelas Farc e pelo exército colombiano, e seus pais foram deslocados do campo, que tanto amavam, para a cidade de Medellín para fugir da violência. Apesar da dor que sua família vivia, a coragem e a bondade de seus avós continuam brilhando: “Meus avós semearam amor e não sede de vingança na família. É por isso que eles fugiram e nunca quiseram espalhar o ódio”, diz Abad.

Por essas experiências vividas, Abad desenvolveu uma infinita empatia diante da câmera, conectando-se com as pessoas que fotografa de uma maneira humana e contando suas histórias para que suas experiências nunca sejam esquecidas. Porque é no esquecimento que atrocidades voltam a acontecer, como o conflito armado colombiano que causou 218.094 mortes no país entre 1958 e 2012, das quais 81% foram vítimas civis.

Abad descreve seu trabalho da seguinte maneira: “A guerra retratada pela mídia banaliza a vida, torna-a estatística. O que faço é tirar foto de frente para as pessoas, olhando nos olhos, para dar nome aqueles que muitas vezes vi chorando, mas que também são os que vejo levantar-se uma e outra vez, sempre respeitando a humanidade”.

No meu primeiro ano na Universidade de Antioquia, morreram cerca de 20 estudantes e professores, pessoas que eu conhecia. Neste país, a palavra sempre representou um perigo

Abad começou sua carreira como jovem estudante de jornalismo na Universidade de Antioquia, Medellín, em 1987, em um contexto social muito difícil. "Eu sempre tive muito interesse em jornalismo, mas tinha medo de escrever", diz Abad. “No meu primeiro ano na Universidade de Antioquia, morreram cerca de 20 estudantes e professores, pessoas que eu conhecia. Neste país, a palavra sempre representou um perigo, especialmente quando se fala em justiça social, igualdade e direitos humanos”.

Apesar desse perigo, Abad Colorado sabia que estava destinado a fazer um trabalho importante em seu país, contando a história da Colômbia através dos olhos daqueles que estrelariam suas fotos.

O fotógrafo que caminha

A linguagem que Abad Colorado usa para descrever sua prática de fotojornalista é particular, como destacado pelo trabalho humano por trás de suas fotografias. "Gosto de caminhar com as pessoas e olhar para seus rostos", diz ele, enfatizando a importância de conhecer em profundidade as histórias das pessoas que fotografa. "Percorri todo esse país e percorri com seu povo". É assim que ele explica os laços profundos que desenvolveu com aqueles que olharam através de suas lentes.

Devido à difícil e complexa situação que Abad decidiu documentar, muitos pensam que suas fotografias são apenas sobre a dor humana que foi vivida durante as décadas de conflito na Colômbia. No entanto, ele afirma que suas fotos também retratam histórias de esperança e força humana. “Não falo apenas sobre dor, mas também sobre resistência e vida. Não se procura dor, encontra-se, assim como se encontra dignidade e humanidade, e os campos florescidos deste país e do povo que vive de sua colheita”.

"A memória consiste em muitos fragmentos diferentes e meu trabalho é documentá-los para que possamos entender um ao outro como nação e como coletivo". A ideia de suas fotografias é contar as verdades humanas dos camponeses do país, histórias que os colombianos que vivem nas grandes cidades ou que não tiveram experiências diretas com a guerra geralmente não conhecem.

Seu trabalho se concentra em nos forçar a ver que em toda guerra há vencedores e perdedores e que, para romper a continuidade da violência, é necessário entender essa dinâmica de poder. “As pessoas mais pobres sempre vão à guerra”, diz Abad, e embora haja uma classe política que lucra com a venda de armas e guerra, também haverá muitos colombianos que sofrerão e perderão tudo.

Como superar a vingança para alcançar a paz

A Colômbia está profundamente dividida. Essas divisões se tornaram mais evidentes do que nunca durante o plebiscito de paz de outubro de 2016, no qual 50,21% dos colombianos votaram contra os acordos. A região de Antioquia, onde Abad nasceu e onde a cidade de Medellín está localizada, foi particularmente franca em sua oposição ao acordo: 62% das pessoas votaram contra.

Devemos educar as novas gerações para não esquecer, mas também para que não repitam as cadeias de ódio

Depois do plebiscito, o ex-presidente Santos toma a decisão unilateral de avançar com a implementação dos acordos de paz, mas o faz em um contexto de profunda rejeição política e social. Sentimentos de vingança por parte da classe política do país se tornaram no maior obstáculo ao avanço da paz na Colômbia.

“Às vezes, as pessoas chegam ao poder, não com a intenção de se unir e melhorar sua sociedade, mas com o objetivo de saquear e beneficiar apenas alguns grupos”, diz Abad. “E isso diz muito sobre nossas sociedades, porque mostra a falta de educação, a falta de cultura política. Quando as pessoas têm que escolher, elas devem assumir a responsabilidade por esses tipos de pessoas que chegam ao poder e depois enganam com mentiras e desinformação”.

Para Abad, essa polarização só pode ser superadas com a educação das próximas gerações sobre o que aconteceu aqui na Colômbia. "É preciso educar as novas gerações para que elas não esqueçam, mas também para que elas não perpetuem o ciclo de ódio". As fotografias de Abad são uma poderosa ferramenta educacional para levar histórias humanas de guerra a pessoas que ainda acreditam que a violência é a única opção para a Colômbia.

O tempo passará, mas o trabalho fotográfico de Abad Colorado permanecerá para nos lembrar que não há maior ameaça à paz do que o esquecimento e que não podemos permitir que outra guerra seja revivida na Colômbia.

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