Desde sua fundação em 1994, La Corriente oferece educação inclusiva para mulheres e jovens LGBTQ e gerencia projetos de desenvolvimento. É uma das principais vozes contra a violência contra mulheres e pessoas LGBTIQ.
“Os grupos de mulheres, como outras organizações da sociedade civil, fazem um trabalho que o Estado não faz, não porque não seja sua responsabilidade, mas porque não está entre suas prioridades”, Blandón diz.
Com seu status legal revogado, La Corriente e outros grupos deixaram de ser elegíveis para financiamento internacional. Assim, foram obrigados a encerrar suas operações.
As perspectivas para as mulheres e a comunidade LGBTIQ são sombrias sem esses grupos trabalhando em seu nome. Não há proteção legal para pessoas LGBTIQ na Nicarágua, onde o sexismo e a homofobia são generalizados. Nos primeiros quatro meses deste ano, a Nicarágua registrou 22 feminicídios. Em 2021 foram 71.
Em 2018, havia 13 abrigos para mulheres e crianças sobreviventes de violência de gênero. Hoje, apenas três permanecem abertos – e precisam operar de forma clandestina para evitar a perseguição do governo, disse ao openDemocracy uma fonte da Articulação Feminista da Nicarágua.
Prejudicial à saúde da mulher
Um dos primeiros grupos feministas a fechar era também um dos mais antigos. Criado em 1984 por mulheres ativistas de esquerda, o Coletivo de Mulheres Matagalpa (CMM) ganhou status legal de ONG em 1990 para trabalhar com mulheres em comunidades carentes no departamento de Matagalpa, uma área rural devastada pela guerra civil financiada pelos EUA na década de 1980.
A Nicarágua é um dos países que menos investem em saúde pública na América Latina, segundo a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Apenas Guiana, Honduras, Venezuela e Haiti gastam menos. Durante décadas, mais de 10 mil mulheres por ano receberam serviços de saúde reprodutiva e mental, apoio jurídico e proteção contra a violência através do CMM.
"Sempre fomos uma voz crítica contra o Estado, exigindo políticas públicas para que as mulheres usufruam de seus direitos em áreas onde o Estado nada faz", disse ao openDemocracy um membro do grupo (que pediu para não ser identificada por medo de represálias).
O status legal do CMM foi revogado em agosto do ano passado, mas o assédio estatal começou em abril de 2018, quando o grupo se envolveu em protestos anti-governamentais que foram reprimidos pelas autoridades. (Pelo menos 325 pessoas morreram, segundo a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, e o regime de Ortega foi acusado de cometer crimes contra a humanidade.)
Três membros estrangeiros do CMM foram deportados e vários membros nicaraguenses forçados ao exílio. Ativistas do CMM que ainda vivem no país enfrentam assédio e perseguição.
“Fomos chamadas de tudo, desde terroristas a lésbicas, financiados por ‘invasores ianques’ e lavadores de dinheiro”, conta a ativista anônima. Desde que Ortega assumiu o poder em 2006, “o povo de Matagalpa sofre uma repressão brutal. Camponeses foram assassinados e nós, feministas, tivemos que nos impor”, acrescentou.
Ela teme que o fechamento do escritório da CMM e a suspensão de seus projetos prejudique a saúde da mulher e permita que a violência de gênero floresça. “O governo acha que está prejudicando quem trabalha nessas organizações, mas está prejudicando as mulheres que nossos projetos beneficiaram por anos", afirma.
Mulheres rurais abandonadas
A Organização de Mulheres Rurais (CMR) representava um dos poucos espaços formalmente organizados para mulheres rurais na Nicarágua. Além de fornecer empréstimos e treinamento em agroecologia para mulheres camponesas, a CMR também lutava por uma distribuição mais equitativa das terras agrícolas.
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