
O caso do assassinato de Marielle Franco ganhou mais uma dimensão macabra, envolvendo o Brasil mais uma vez em um manto de perguntas, dúvidas e desconfiança diante da relação entre a família Bolsonaro e os envolvidos.
Na madrugada de domingo (9), Adriano Magalhães da Nóbrega, ex-capitão da PM, foi morto no norte da Bahia durante uma operação envolvendo forças policiais locais e do Rio de Janeiro. Nóbrega estava foragido há mais de um ano acusado de comandar uma das milícias mais antigas do Rio, o Escritório do Crime.
O Escritório do Crime está sendo investigado por organizar esquemas de grilagem na zona norte do Rio e por ligação com o assassinato da vereadora Marielle em 14 de março de 2018, na capital fluminense.
Os dois acusados do crime são Ronnie Lessa, quem teria atirado contra Marielle e o motorista Anderson Gomes, e Élcio Queiroz, quem estaria dirigindo o veículo durante o atentado. Ambos acusados estão presos sob a acusação de terem cometido o crime.
Lessa também é acusado de integrar o Escritório da Morte. É importante lembrar que Jair Bolsonaro também tem estreitas relações com Lessa, que inclusive é seu vizinho.
Não está claro por que o Capitão Adriano, como era conhecido, estava escondido na Bahia. O que está claro é que Nóbrega tinha laços, direto e indiretos, com a família Bolsonaro.
Nóbrega e Flávio Bolsonaro
Nóbrega foi citado na investigação no caso da “rachadinha” no gabinete de Flávio Bolsonaro, atual senador e filho mais velho do presidente, quando era deputado estadual pelo Rio de Janeiro.
Durante o período sendo investigado, Flávio empregou duas familiares de Nóbrega em seu gabinete
Segundo as autoridades, contas de Nóbrega foram usadas para transferir dinheiro para Fabrício Queiroz, então assessor de Flávio e suposto responsável por comandar o esquema de devolução de salários.
Durante o período sendo investigado, Flávio empregou duas familiares de Nóbrega em seu gabinete: a mulher do ex-capitão, Danielle Mendonça da Costa Nóbrega, e a mãe dele, Raimunda Veras Magalhães, entre 2016 e 2018. Segundo apontam as investigações, as familiares estavam entre os funcionários fantasmas no gabinete de Flávio.
Em outras ocasiões, tanto Flávio quanto Jair Bolsonaro defenderam Nóbrega. Em 2005, quando o miliciano foi preso em conexão com o homicídio de um guardador de carros, Flávio condecorou Nóbrega com a medalha Tiradentes, a mais alta honraria da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. Em 2003, Flávio já havia homenageado o ex-capitão.
Na mesma ocasião de 2005, Jair Bolsonaro, então deputado federal, defendeu Nóbrega quando ele foi condenado de homicídio. Nóbrega foi absolvido depois em um novo julgamento.
Na quarta-feira (12), Flávio se pronunciou pela primeira vez em relação à morte de Nóbrega. Em mensagem no Twitter, o senador denuncia que “pessoas” estão tentando acelerar a cremação do corpo do ex-PM para “para sumir com as evidências de que ele foi brutalmente assassinado na Bahia”.
Como Nóbrega morreu?
A versão oficial aponta que Nóbrega reagiu à ação da polícia, gerando assim uma troca de tiros. No entanto, o advogado de Nóbrega, Paulo Emílio Catta Preta, disse que Nóbrega havia lhe contado que temia ser alvo de uma queima de arquivo.
No dia 1 de fevereiro, a polícia da Bahia já havia tentado prender o miliciano durante a celebração de seu aniversário em uma mansão alugada em um condomínio de luxo na Costa do Sauipe, na Bahia. No entanto, o ex-capitão conseguiu fugir uns minutos antes da polícia chegar, deixando sua mulher e duas filhas no local. Na pressa, Nóbrega também deixou na mansão um RG falso.
Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) divergem em suas opiniões sobre as possíveis consequências que a morte de Nóbrega pode ter sobre a investigação do assassinato de Marielle
Nessa ocasião, Nóbrega ligou para seu advogado, Preta, para dizer que sentia que temia ser morto se fosse pego ou caso se entregasse.
Além disso, a família de Nóbrega disse que Nóbrega estava em condições precárias para fugir e que não estava armado no momento que foi morto, contrariando a versão das autoridades.
O que a morte significa no caso Marielle?
Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) divergem em suas opiniões sobre as possíveis consequências que a morte de Nóbrega pode ter sobre a investigação do assassinato de Marielle. O STF deve decidir se o caso vai ser federalizado em data ainda não marcada.
Antes da morte de Nóbrega, a expectativa era que o STF mantivesse a investigação nas mãos das autoridades do Rio de Janeiro.
Mas os novos desdobramentos podem influenciar essa decisão. Dois ministros do Supremo acreditam que a morte de Nóbrega traz efeitos sobre a discussão, podendo afetar o resultado final.
Outros ministros, mantêm que a decisão correta é manter a investigação no Rio, uma opinião compartilhada pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro.
Este novo desdobramento não abre novas portas no caso do assassinato de Marielle, mas traz à tona novamente o grotesco envolvimento do atual presidente da República e organizações criminosas.
Bolsonaro pode não ter relação direta com a morte da vereadora carioca, ativista social negra e “cria da Maré”, mas sua relação com toda a rede suspeita de estar por traz do assassinato político que sacudiu o Brasil está mais do que consolidada.
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