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América Latina faz pouco progresso no combate à corrupção

Último índice de medição mostra que os países latino-americanos, apesar de muita retórica, continuam estancados

Sean Doherty
24 Fevereiro 2023, 10.08
A América Latina continua tropeçando em suas ações contra a corrupção
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Lucy Brown (loca4motion) / Alamy Stock Photo

Em 2022, os países da América Latina e do Caribe permaneceram estagnados no combate à corrupção, devido à falta de vontade ou capacidade da maioria dos governos de abalar as poderosas redes que lucram com a corrupção tradicional.

O Índice de Percepção de Corrupção de 2022 , da Transparência Internacional, que classifica 180 países de acordo com as percepções de corrupção em suas instituições públicas, mostrou um panorama estático da América Latina, com poucas exceções. O Uruguai continuou sendo o país com melhor desempenho, ficando acima de diversas economias desenvolvidas. A campanha anticorrupção da República Dominicana rendeu alguns resultados positivos, mas Haiti, Venezuela e Nicarágua continuaram como destaque negativo.

A "pontuação de corrupção" global da América Latina permanece inalterada desde 2021, mas 163 lugares separam o melhor país — Uruguai — do pior, Venezuela.

A estagnação é um tema recorrente no relatório deste ano, segundo a Transparency International. "Nas Américas, 27 dos 32 países estão há vários anos em um impasse na luta contra a corrupção. É preciso fazer melhor uso da tecnologia, redobrar a colaboração entre os promotores de toda a região e implementar medidas mais contundentes para deter os fluxos financeiros ilícitos", explica Luciana Torchiaro, assessora regional da Transparência Internacional para as Américas.

Mapa das Américas classificados por sua corrupção

Haiti: corrupção desenfreada em meio ao colapso da segurança

O Haiti, preso entre a turbulência política e o colapso institucional após o assassinato de seu presidente em 2021, caiu seis lugares no ano passado, ficando em 171º lugar entre os 180 países.

A corrupção foi a principal fonte de lucros ilícitos no país, acima de crimes como tráfico de drogas, tráfico de pessoas e contrabando de migrantes, segundo o relatório de 2021 publicado pelo Global Financial Integrity, um think-tank americano focado em crimes financeiros.

Políticos e policiais haitianos há muito mantêm laços estreitos com facções criminosas, inclusive financiando-as para reprimir a oposição política. Mas sanções internacionais contra alguns dos líderes mais conhecidos do Haiti forneceram mais detalhes sobre tais redes em 2022. O ex-presidente Michel Martelly foi a figura mais proeminente entre os sancionados pelo Canadá por suposto financiamento de gangues. Outros visados pelos Estados Unidos e Canadá incluíram dois ex-primeiros-ministros e figuras importantes em ambas as casas da Assembleia Nacional do Haiti.

“Essas pessoas se beneficiam diretamente das atividades de gangues e estão associadas a um sistema corrupto”, disse a ministra de relações exteriores do Canadá, Mélanie Joly, em novembro do ano passado.

Embora grande parte da classe dominante tradicional do Haiti tenha deixado suas posições de liderança, as tentativas de lucrar com a atual deterioração continuam. O homem mais rico do Haiti, Gilbert Bigio, também é suspeito de financiar operações de gangues e permitir a importação ilegal de armas pesadas para grupos armados.

A corrupção desenfreada no Haiti levou ao impasse em que o país se encontra — e do qual dezenas de milhares de habitantes desesperadamente procuram fugir.

A percepção do país, tanto no país como no exterior, pode estar em um nível baixo histórico, o que torna ainda mais preocupante o fato de não ter sido o pior da lista para a América Latina e o Caribe.

Venezuela: feudos criminosos permitem propagação da corrupção

O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, reinventou-se. Superou tentativas de destituição, rebateu análises de fraco apoio político e sobreviveu a sanções internacionais.

A corrupção no Haiti levou ao impasse em que se encontra — e do qual dezenas de milhares de habitantes desesperadamente procuram fugir

Maduro tem mostrado persistência em perseguir oficiais corruptos do governo, militares, policiais e juízes com suas operações de "punho de ferro". Mas ao mesmo tempo, ofereceu posições governamentais e militares a aliados políticos e oponentes a fim de se aferrar ao poder.

A mineração de ouro e o tráfico de cocaína em particular serviram bem a Maduro, na medida em que permitiram que os militares levassem uma fatia dessas economias criminosas para complementar seus magros salários, ou toleraram que os governadores do estado recebessem subornos para manter os carregamentos em movimento. Em uma escala menor, esses governadores seguem o exemplo de Maduro em suas regiões, policiando e recebendo uma parte das lucrativas economias criminosas. Estes feudos criminosos aumentaram a percepção da corrupção entre os venezuelanos.

E agora a Venezuela está se tornando um produtor de cocaína, uma tendência que pode oferecer mais oportunidades de lucro para Maduro e seus comparsas. A economia da Venezuela também está começando a se recuperar. A produção de petróleo está renascendo, enquanto as relações diplomáticas e o comércio com a Colômbia foram restaurados. Embora a cleptocracia característica do regime de Hugo Chávez tenha desaparecido com a falência do Estado, novas oportunidades podem se apresentar com o aumento dos lucros do petróleo.

Costa Rica: aluno exemplar da América Central vacila

A Costa Rica, que obteve sua segunda nota mais baixa, teve a maior queda da região, com quatro pontos a menos e nove posições abaixo das de 2021, o que significa que agora é vista como um país com "sérios problemas de corrupção".

A Venezuela está se tornando um produtor de cocaína, tendência que pode oferecer mais oportunidades de lucro para Maduro e seus comparsas

A assessora regional da Transparência Internacional para a região, Luciana Torchiaro, explica que as denúncias de financiamento político ilegal influenciaram a queda na campanha eleitoral do presidente Rodrigo Chaves, assim como os detalhes de escândalos de corrupção, como o caso Cochinilla, que envolveu a suposta apropriação indevida de US$ 125 milhões de fundos públicos, bem como um esquema de propina envolvendo funcionários do governo e executivos da construção civil.

“As autoridades devem ver a pontuação do Índice de Percepção da Corrupção como um alerta. O país deve redobrar seus esforços contra a corrupção, especialmente para evitar a possível infiltração do narcotráfico na política”, defende Torchiaro.

Há também preocupação com a penetração criminosa na força policial. Houve agentes ligados a roubos de cocaína, que vêm aumento diante do fluxo de maiores quantidades de drogas para a Costa Rica. Em uma manobra incomum, o governo anunciou em outubro que começaria a usar testes do polígrafo, mais conhecidos como detector de mentiras, para expurgar a instituição de policiais desonestos.

O ranking também confirmou que a Costa Rica teve um ano sombrio em 2022, com taxas recordes de homicídios, que o governo atribuiu a acerto de contas entre as facções criminosas de traficantes.

A Costa Rica continua sendo um dos países menos corruptos da América Latina, mas a deterioração da força e da transparência de suas instituições públicas é um sinal preocupante.

Uruguai: avança apesar dos escândalos de corrupção

O Uruguai testou sua posição no topo do ranking latino-americano na lista em 2022. O presidente Luis Lacalle Pou tem enfrentado uma enxurrada de críticas sobre o processo em andamento contra o ex-chefe de sua guarda pessoal, Alejandro Astesiano. Ele foi inicialmente detido por vender passaportes uruguaios falsos a estrangeiros, principalmente russos. Mas as investigações contra ele aumentaram, incluindo uma denúncia de que teria vendido software do governo para líderes empresariais, que o usaram para monitorar seus oponentes políticos.

Apesar de escândalos, Uruguai manteve a liderança no ranking entre os países da região e até melhorou seu desempenho

Paralelamente, Lacalle Pou enfrentou acusações de que funcionários dos ministérios do Interior e das Relações Exteriores ajudaram o notório traficante de drogas Sebastián Marset a obter um novo passaporte quando foi capturado no exterior.

Apesar desses casos, Uruguai manteve a liderança no ranking entre os países da região e até melhorou seu desempenho. Classificado como o 14º país menos corrupto do mundo, agora está no mesmo nível de países como Canadá, Islândia e Japão.

A razão da sua atuação poderá residir no fato de as suas instituições judiciárias e de segurança parecerem ter respondido de forma contundente a estes desafios. O caso contra Astesiano evoluiu rápida e publicamente, com uma comissão parlamentar nomeada para investigar se outros atos criminosos podem ter ocorrido no palácio presidencial. Senadores da oposição também apresentaram um projeto de lei propondo penas de prisão de dez anos para políticos corruptos.

No entanto, sua alta classificação traz uma ressalva, já que o índice classifica os países apenas de acordo com os níveis de percepção de corrupção no setor público, o que exclui problemas como atividades de crime organizado, evasão fiscal ou lavagem de dinheiro.

O futuro desses casos pode afetar fortemente a posição do Uruguai como líder do pelotão.

*Gavin Voss contribuiu com a reportagem deste artigo.


Este artigo foi originalmente publicado em inglês e espanhol pelo InSightCrime.

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