democraciaAbierta: Opinion

Estado brasileiro será julgado pela Corte Interamericana no caso de assassinato de defensor de direitos humanos

A Comissão Interamericana apresentou à Corte Interamericana o caso do advogado popular Gabriel Sales Pimenta contra o Estado brasileiro pela situação de impunidade na qual se encontram os fatos relacionados à sua morte no Pará em 1982.

CEJIL - Brasil
22 Dezembro 2020, 10.17
O Estado tem as mãos cheias de sangue
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NurPhoto/NurPhoto/PA Images

A Comissão Interamericana apresentou à Corte Interamericana o caso do defensor de direitos humanos o advogado popular Gabriel Sales Pimenta contra o Estado brasileiro pela situação de impunidade na qual se encontram os fatos relacionados à sua morte no Pará em 1982

Em um país onde a cada dia mais pessoas defensoras de direitos humanos, principalmente aquelas que lutam pelo à terra e ao meio ambiente, são ameaçadas e assassinadas, é importante exigir do Estado medidas de proteção, justiça e reparação para mudar essa realidade.

Os dados sobre violência contra defensores/as de direitos humanos no Brasil são alarmantes. A CPT registrou em 2019 o maior número de conflitos no campo registrado nos últimos 14 anos, uma média de 5 conflitos a cada dia, 96% deles envolveram alguma forma de violência provocada por proprietário ou grileiros. De acordo com o relatório da ONG Global Witness “Defendendo o Amanhã: A Crise Climática e as Ameaças às Pessoas Defensoras da Terra e do Meio Ambiente”, publicado em 2020, o ano anterior foi o maior em número de assassinatos, desaparecimentos forçados e ameaças de pessoas que defendem a terra e o meio ambiente.

O Centro Pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) e a Comissão Pastoral da Terra (CPT) apresentaram, em 2006, o caso do assassinato do advogado defensor de direitos humanos Gabriel Sales Pimenta à Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

Gabriel Pimenta exerceu um papel fundamental na representação de trabalhadores rurais em Marabá, no estado do Pará. Ele foi advogado popular do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Marabá e defensor na região de Pau Seco em ações judiciais contra os latifundiários. Nos meses que antecederam seu assassinato, Gabriel recebeu diversas ameaças em decorrência do papel que cumpria na defesa de camponeses em luta pela terra, tendo solicitado a proteção do Estado ao denunciar as ameaças recebidas às autoridades de Belém, capital do estado do Pará, onde foi pessoalmente pedir ajuda em três ocasiões. A ajuda nunca chegou e no dia 18 de julho de 1982, o defensor foi fatalmente baleado com disparos à queima-roupa, em plena via pública.

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Gabriel Sales Pimenta | Wikimedia Commons

Em seu Relatório de Mérito, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) concluiu que o Estado brasileiro é responsável pela violação dos direitos à vida, à justiça e ao direito de associação estabelecidos na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem; e dos direitos à integridade pessoal, às garantias judiciais, e à proteção judicial estabelecidos na Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Igualmente, a CIDH recomendou ao Estado que outorgue uma reparação integral aos familiares, que realize e conclua uma investigação de maneira diligente e eficaz e que tome medidas de não repetição, relacionadas com a prevenção de atos de violência e proteção de defensores de direitos humanos, incluindo o fortalecimento do Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) e a capacidade para investigar delitos contra defensores de direitos humanos.

A impunidade é um fator que incentiva o ataque aos defensores/as de direitos humanos, uma vez que os agressores agem com a certeza de que sua ilegalidade não terá consequências

No dia 30 de setembro deste ano, no marco do 177º Período de Sessões da CIDH o CEJIL e a CPT fizeram reunião de trabalho com o Estado brasileiro sobre o cumprimento das recomendações emitidas pela CIDH em seu Relatório de Mérito. Essa reunião igualmente contou com a importante participação de Rafael Sales Pimenta, irmão do defensor. Nessa oportunidade, as organizações peticionárias demonstraram a falta de implementação de todas as recomendações e solicitaram, conjuntamente com o representante da família, que o caso fosse enviado pela CIDH à jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH).

Em reconhecimento à inércia do Estado brasileiro em implementar as recomendações emitidas, a CIDH apresentou, em 04 de dezembro de 2020, o caso perante a Corte IDH. Consideramos que a análise do caso Gabriel Pimenta pela Corte IDH é uma grande oportunidade para se reforçar as obrigações internacionais do Estado brasileiro em prevenir violações contra defensores/as de direitos humanos e proteger o direito à vida e a integridade pessoal para que os defensores/as exerçam livremente suas atividades sem sofrer atentados, ameaças ou represálias. O caso reflete o cenário atual de grave situação de violência no campo no Brasil, que já perdura décadas. Esse padrão de graves violações de direitos humanos no campo é decorrente da disputa pelos recursos naturais e pela desigualdade no acesso à terra.

A falta de resposta estatal contribui para o aumento da violência no campo, perseguição e o silenciamento das pessoas que lutam por ideais de justiça, igualdade e democracia. A impunidade é um fator que incentiva o ataque aos defensores/as de direitos humanos, uma vez que os agressores agem com a certeza de que sua ilegalidade não terá consequências. Por isso, é imprescindível que sejam realizadas investigações oportunas e eficazes para esclarecer os fatos e punir os responsáveis.

Comemoramos a apresentação do caso à Corte IDH e esperamos que a decisão do Tribunal reconheça a responsabilidade internacional do Estado brasileiro e estabeleça estândares para o desenvolvimento políticas de proteção e garantia para o livre exercício do direito a defender direitos no Brasil.

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