Não se tratava de uma luta entre aqueles que são a favor ou contra o aborto. Tratava-se de mostrar como a permanência do status criminal do aborto não reduz o número de abortos. Em vez disso, obriga as mulheres a recorrer a procedimentos inseguros e tem o maior impacto sobre as mais vulneráveis: pobres, migrantes, aquelas que vivem em áreas remotas ou em áreas controladas por grupos armados ilegais.
Fizemos centenas de entrevistas, organizamos dezenas de eventos públicos e aumentamos a conscientização. Conversamos com formadores de opinião, jornalistas e políticos e tomamos as ruas e as redes sociais com nossa mensagem e nossos lenços verdes, símbolo do movimento pelo aborto legal na América Latina.
Grande avanço
O tribunal constitucional não descriminalizou totalmente o aborto (como havíamos solicitado), mas sua decisão mantém as três exceções previamente permitidas além das 24 semanas.
Este é um grande avanço, porque estabelece um prazo razoável em que todas meninas e mulheres grávidas que precisam de um aborto possam ter acesso a uma unidade de saúde – sem medo de serem processadas. Já não terão de colocar a sua saúde e a sua vida em risco recorrendo a procedimentos inseguros.
Muitos questionam se o tribunal foi longe demais ao adotar o prazo de 24 semanas. A resposta é absolutamente não.
A grande maioria das interrupções ocorre durante os primeiros três meses de gravidez. Os poucos abortos realizados em fases posteriores correspondem a mulheres em situação de vulnerabilidade: aquelas que vivem em zonas rurais ou em locais sem centros de saúde, sobreviventes de abuso familiar, as mais pobres, as desempregadas, as privadas de informação precisa.
Por meio dessa decisão, garantiremos que os vulneráveis tenham tempo de acessar os serviços de saúde e que todas as mulheres, sem exceção, tenham acesso a informações e métodos contraceptivos e sejam capazes de prevenir gravidezes indesejadas.
Um modelo para a América Latina
Esta decisão beneficiará também as mulheres migrantes. O tribunal reconheceu, como argumentamos em nosso caso, que a criminalização “afeta de maneira diferente – e desproporcional – mulheres vulneráveis, incluindo aquelas em situação migratória irregular”. Muitas mulheres da vizinha Venezuela estão fugindo de seu país, inclusive com necessidades de saúde sexual e reprodutiva não atendidas. Dessa forma, a decisão se torna um modelo não apenas para a Colômbia, mas para toda a região.
Esperamos que a Colômbia volte a ser um ponto de referência na América Latina e no Caribe, como foi em 2006, quando o Tribunal Constitucional permitiu as três exceções para o aborto.
Esperamos também que esta decisão contribua para acabar com o uso do direito penal para regular o aborto na região – como aconteceu na Argentina e, mais recentemente, no México. Estamos convencidas de que a “onda verde” é imparável.
Nós da Women's Link e da Causa Justa trabalharemos para que essa decisão seja plenamente cumprida. Também exigiremos uma política pública integrada que permita que mulheres, meninas e gestantes tenham escolhas e acesso a seus direitos sexuais e reprodutivos, incluindo educação sexual, acesso à contracepção e garantias adequadas de uma gravidez saudável para quem quer ser mãe.
As mulheres são as que sabem o que é melhor para elas. O Estado deve respeitar suas decisões.
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