Nos anos 2000, o programa de transferência de renda de Lula de 2003, o Bolsa Família, bem como maiores direitos para os trabalhadores e melhores condições e negociações salariais contribuíram para a redução da desigualdade. O Partido dos Trabalhadores (PT) também investiu em infraestrutura pública, especialmente de água. Mas o presidente de direita, Jair Bolsonaro, atrasou o relógio.
”Bolsonaro esvaziou as instituições que monitoram os direitos e condições trabalhistas”, disse Alexandre Valadres, especialista em trabalho rural do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) de Brasília. Ele destacou que “a cana-de-açúcar, como qualquer outra monocultura, espreme a agricultura familiar” – tornando a situação dos trabalhadores da cana especialmente precária.
Os sindicatos de trabalhadores rurais, muitas vezes o único apoio aos trabalhadores ameaçados por facçõea armadas em áreas remotas, estão carentes de financiamento.
“A maioria dos nossos escritórios fechará se Bolsonaro permanecer no poder”, disse Zé Areia, da Federação dos Trabalhadores da Agricultura (Fetagri), em Ourilândia, uma vila no estado do Pará, na região amazônica. A violência contra líderes trabalhistas e comunitários aumentou no Pará desde que Bolsonaro chegou ao poder, em 2019. Areia diz que Paulino da Silva, seu colega no pequeno escritório da Fetagri em Ourilândia, foi assassinado no ano passado.
Lula, que nasceu na pobreza no vilarejo de Caetés, 240 km ao norte da Usina Santo Antônio, agora é visto como a única esperança para uma enorme faixa de trabalhadores de baixa renda nas regiões pobres no Nordeste, na Amazônia e nas favelas urbanas do Rio ou de São Paulo.
De acordo com pesquisas de opinião do Datafolha, mais de 50% dos trabalhadores que ganham R$ 2,2 mil ou menos por mês vão votar em Lula. Mas o dilema para esses trabalhadores de cana-de-açúcar – de não poderem cultivar seus próprios alimentos, mesmo trabalhando em uma economia de commodities de monocultura – reflete um dilema maior para os planejadores econômicos do PT.
’Fome em um mar de grãos’
Mais do que em qualquer outro momento desde o início do século 20, a economia brasileira é impulsionada pelas exportações de commodities, de alimentos básicos, como cereais ou carne bovina, a minérios como ferro, bem como a exploração de petróleo offshore no Atlântico.
As exportações de soja, milho, algodão e açúcar impulsionam os lucros do agronegócio, especialmente em estados como Mato Grosso, um reduto de Bolsonaro no Centro-Oeste, onde novas “cidades da soja” estão sendo construídas às margens da floresta amazônica.
A disparada dos preços internacionais das commodities, exacerbada pela invasão da Ucrânia pela Rússia, se traduziu em enormes lucros para grandes produtores de soja, comerciantes de commodities como Cargill e Bunge e fundos de ações globais.
Mas os pequenos produtores estão sendo pressionados, o investimento nas indústrias manufatureiras está estagnado e a maioria da população é gravemente atingida pelo aumento dos preços dos alimentos. “Estamos vendo fome em um mar de grãos”, disse Luiz Alberto Melchert, economista brasileiro especializado em agronegócio.
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