Duas decisões cruciais, e dois erros de cálculo estratégico – como a história demonstrará – orientados pela mesma visão estratégica dos “missionários de Biden” que desde o início do governo democrata vêm tentando dividir e polarizar o mundo, forçando uma nova Guerra Fria entre países democráticos e países autocráticos, definidos de forma “autocrática” e unilateral pelos próprios Estados Unidos.
Essas duas decisões foram sustentadas na mesma certeza dos americanos e seus satélites de que poderiam impor uma derrota imediata e humilhante à Rússia, com o estrangulamento de sua economia nacional, através de um pacote de sanções econômicas de dimensões desconhecidas, envolvendo o bloqueio europeu do comércio do petróleo e do gás russos, o congelamento e expropriação das reservas e ativos russos depositados nos bancos do G7, e finalmente, através da suspensão de todas as relações financeiras da economia russa com esses mesmos países e todos os demais que viessem a apoiar as sanções globais comandadas por norte-americanos e europeus.
Nos dois casos, entretanto, parece que os Estados Unidos e seus satélites erraram redondamente.
Primeiro, porque a maioria dos Estados do sistema internacional vem se mostrando extremamente reticente a entrar em uma nova Guerra Fria, e vem resistindo terminantemente a tomar partido no conflito da Ucrânia, negando-se a apoiar as sanções econômicas aplicadas por americanos e europeus contra a Rússia.
Dos 194 países com assento nas Nações Unidas, só 47 apoiaram essas sanções, sendo muitos absolutamente insignificantes, como é o caso de Andorra, Mônaco, Islândia, Liechtenstein, Micronésia, San Marino, ou Montenegro do Norte, entre outros.
Em segundo lugar, pesquisas recentes realizadas por universidades europeias e americanas vêm indicando que a maioria da população mundial que vive fora dos países que compõem a coalizão minoritária dos Estados Unidos e seus satélites europeus e asiáticos não veem o mundo como eles, não apoiam a guerra nem as sanções econômicas aplicadas à Rússia
Não se consideram menos democráticos do que os americanos e europeus, e consideram que a “coalizão ocidental” está envolvida no conflito da Ucrânia em defesa de seus interesses geopolíticos, e não em defesa de valores ou direitos humanos supostamente universais.
Mas o que é pior, do ponto de vista euro-americano, é que depois desses erros iniciais de avaliação, a “devastadora” guerra econômica desencadeada contra a Rússia não teve sucesso, ou pelo menos não logrou seus objetivos.
Não conseguiu estrangular de forma instantânea a capacidade financeira dos russos de sustentarem sua ofensiva na Ucrânia, como tampouco teve os impactos esperados sobre o funcionamento interno da economia russa, que conseguiu driblar o cerco comercial e financeiro abrindo novos mercados, redesenhando sua estratégia econômica nacional e alcançando, já em 2023, segundo o FMI, um crescimento econômico positivo.
Neste sentido, erraram uma vez mais os estrategos americanos e europeus.
Suas sanções financeiras e seu bloqueio comercial da Rússia acabaram tendo um efeito absolutamente destrutivo sobre as economias europeias, que enfrentam uma acelerada desindustrialização – como é o caso da Alemanha – ou uma desintegração social e política – como está se assistindo na França e na própria Inglaterra.
As previsões indicam que até 2030 a Inglaterra já poderá ter se transformado num país com renda per capita inferior à da Polônia, que foi até hoje uma fornecedora de mão de obra barata da economia inglesa.
Em parte por conta do Brexit, é verdade, em parte por conta do seu envolvimento cada vez mais agressivo na escalada europeia contra a Rússia.
Crises e desintegrações econômicas e sociais causadas, em última instância, pelas sanções econômicas que cortaram a energia barata da Europa, diminuíram a competitividade de suas economias e atingiram em cheio o salário da população, através da inflação e do aumento dos custos de energia e alimentação.
Vasos comunicantes que estão atuando também na atual crise financeira dos bancos americanos e europeus, premidos pelo aumento da inflação e da taxa de juros, e ainda pela perda de credibilidade de seus títulos públicos, depois do congelamento e expropriação das reservas e aplicações russas.
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