O fato de uma desembargadora e um deputado federal terem endossado essas fake news só as fortaleceu e ampliou sua virulência, drenando parcialmente a empatia e a solidariedade geradas imediatamente pelo assassinato da vereadora naquela noite tenebrosa se março de 2018. Aliás, o componente da “confiança na idoneidade e autoridade” da fonte que divulgou a mentira fortalece seu conteúdo e amplia a sua virulência (possibilidade de ser compartilhado para mais pessoas no menor tempo).
Não é só por mera maldade que as mentiras que buscam “explicar” e “justificar” a execução da vereadora carioca sigam sendo reproduzidas em circuitos de extrema-direita analógicos e digitais. É também por estratégia política. A elucidação completa do assassinato de Marielle Franco - ocorrido sob a intervenção militar no Rio de Janeiro comandada pelo do general Braga Netto, que viria a ser ministro da Casa Civil e, depois, da Defesa do governo Bolsonaro - poderá dilapidar por completo o capital político a extrema-direita. Portanto, até lá, esta precisa enfraquecê-la o quanto puder.
A direita sabe o quanto essa verdade também a afetará, uma vez que compactuou com o banditismo da extrema-direita tanto no golpe contra a presidenta Dilma Rousseff em 2016 quanto na eleição de Bolsonaro em 2018. Por isso, sua mídia se encarrega da light difamation contra os políticos de esquerda que buscam preservar a memória e o legado de Marielle Franco.
Recentemente um dos mais acessados e importantes portais de notícia brasileiro, o UOL, publicou um tweet - “manchete” do Twitter- enganoso em relação à ministra da Igualdade Racial do novo governo Lula, Anielle Franco, irmã da vereadora assassinada.
Com o propósito de divulgar o fato de que Anielle havia sido incluída na lista da prestigiada revista americana Time de mulheres influenciadores, o portal redigiu o tweet de modo a sugerir que a ministra era “bilionária e defensora do aborto”, gerando uma onda de ódio contra Anielle e reforçando as calúnias e mentiras contra sua irmã morta nas mídias sociais da extrema-direita. Não, não se trata de “erro”, mas comunicação política antipetista e anti-esquerda que venha a isentar a mídia de direita na cumplicidade indireta no assassinato da vereadora carioca.
Em entrevista concedida em 2019 à imprensa internacional logo após meu exílio, eu disse que ao fim e ao cabo seria Marielle a derrubar Bolsonaro; que sua morte não era o fim. Mantenho a afirmação mesmo depois de termos vencido, por meio do voto, a eleição do ano passado. Primeiro porque Bolsonaro aí figura como metonímia da extrema-direita brasileira; e, como tal, ainda não foi derrubado.
Marielle Franco amedronta esses fascistas como um poderoso espectro. Um aspecto está, assim como o passado, ainda que ausente, presente! E, como o passado-presente, ele assombra os que escondem, os que fingem e os que mentem.
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