democraciaAbierta: Opinion

Nicarágua condena centenas de opositores à morte civil

Em sentença disfarçada de libertação, 222 presos políticos foram enviados aos EUA, despojados de sua nacionalidade

democracia Abierta
22 Fevereiro 2022, 10.00
"Não têm força contra este povo enorme"
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dpa picture alliance/Alamy Stock Photo

Em uma ação que pegou muitos observadores de surpresa, em 9 de fevereiro de 2023, o regime liderado por Daniel Ortega e sua esposa e vice-presidente Rosario Murillo libertaram 222 presos políticos. Os opositores foram retirados de suas celas e colocados em um avião com destino a Washington DC, nos Estados Unidos.

A ação parece ter sido uma resposta à pressão internacional, cuja intensidade vem aumentando devido ao endurecimento do regime de Ortega-Murillo. Segundo o presidente americano, Joe Biden, o acordo abre uma porta para o diálogo enquanto o Departamento de Estado se mobiliza para facilitar a permanência legal dos opositores no país.

Tecnicamente, os presos políticos não foram libertados, mas desterrados. Cada um foi destituído de sua nacionalidade por meio de documento legal, assim como de todos os seus direitos civis, incluindo suas propriedades no país. Além de terem seus bens expropriados, os presos políticos perderam o direito de concorrer a cargos públicos na Nicarágua.

Frente ao extremismo da sentença de expulsão, alguns dos presos preferiram não viajar. Já outros aceitaram oferta de nacionalidade do governo espanhol para evitar possibilidade de se tornarem apátridas.

Os presos políticos não foram libertados, mas desterrados

Qual é o argumento que sustenta esta sentença?: Acusação de "traição contra a pátria", conforme consta no documento apresentado antes do embarque.

Embora a libertação de presos políticos esteja prevista em uma democracia por ser um abuso dos direitos humanos, o que o governo Ortega-Murillo fez não deve ser confundido com a concessão de "liberdade".

Ao tirar seus opositores da prisão, o governo Ortega automaticamente está violando seus direitos, uma vez que os termos da soltura implicam uma confissão por parte deles. Conforme explicado no Artigo 7 do Estatuto de Roma, "deportação" significa uma "transferência forçada de uma população" e um "crime contra a humanidade". Em outras palavras, é um deslocamento de pessoas sem motivos autorizados pelo direito internacional.

94 opositores despojados de sua cidadania

Mas o regime de Ortega-Murillo não se contentou com a libertação de presos políticos. Em 15 de fevereiro, um juiz anunciou que 94 opositores, incluindo escritores, jornalistas e ativistas de direitos humanos no exílio, perderiam a cidadania.

A mensagem que o regime envia ao mundo com suas ações é clara: fará o que for preciso para se manter no poder

A mensagem que o regime envia ao mundo com suas ações é clara: fará o que for preciso para se manter no poder, inclusive novas formas de repressão e intimidação como esta.

Entre os opositores afetados pela medida estão o jornalista investigativo Carlos Chamorro, a poeta e escritora Gioconda Belli, o romancista Sergio Ramírez, o bispo Silvio Báez, a feminista Sofía Montenegro e a defensora dos direitos humanos Vilma Núñez.

"Fomos destituídos de nossa nacionalidade e o regime de Ortega Murillo anunciou que confiscará nossos bens," declarou o ativista de direitos humanos Camilo de Castro, que está entre os alvos de represálias. "Leonor e eu vamos perder nossa casa e minha mãe vai perder o que construiu ao longo de uma vida de trabalho. Também fomos acusados ​​de traição e declarados foragidos da justiça”, concluiu.

Outra das prejudicadas, a jornalista Lucía Pineda, disse em diálogo com o El País da Espanha: "são ladrões, mas Deus vai me devolver uma casa melhor do que a que estão roubando". Pineda foi detida em 2018, depois que a polícia invadiu as instalações do canal de televisão 100% Noticias em Manágua, onde Pineda trabalhava.

Diante desta situação, o Escritório do Alto-comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos na América Central condenou "da forma mais enérgica esta nova onda de violações dos direitos humanos".

O jornalista Carlos Chamorro, filho da ex-presidente Violeta Barrios, afirmou nas redes sociais que "os punidos por medidas de ódio e vingança são todos os cidadãos que exigem mudanças com justiça e liberdade, incluindo servidores públicos, civis e militares" .

Já a poeta Belli respondeu a Ortega com um poema.

Se o regime de Ortega-Murillo pretendia com essas medidas silenciar as vozes críticas, é provável que conquiste o contrário e que o clamor internacional contra o endurecimento da ditadura centro-americana seja ouvido com mais força e clareza.

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