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Peru enfrenta uma batalha entre os extremos

A intensa fragmentação política do Peru vence o primeiro turno de uma eleição presidencial marcada pela radicalização

democracia Abierta
16 Abril 2021, 12.01
O candidato Pedro Castillo em um debate presidencial em março de 2021
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REUTERS/Sebastian Castaneda/Alamy Stock Photo

Com apenas 19,07% dos votos, o sindicalista e professor Pedro Castillo (Peru Libre) venceu o primeiro turno das eleições presidenciais no Peru no último domingo, 11 de abril, mostrando que o verdadeiro vencedor foi a fragmentação política em um pleito que apresentou nada menos que 18 candidatos. Os peruanos consolidaram a polarização no país ao levar a ex-deputada de direita Keiko Fujimori (Fuerza Popular) ao segundo turno. A filha do ex-ditador Alberto Fujimori, que cumpre pena de 25 anos de prisão por violações dos direitos humanos, obteve 13,37% dos votos.

Os candidatos que terminaram em terceiro e quarto lugares não ficaram muito atrás. O ultraconservador Rafael López Aliaga (Renovación Popular) e o economista neoliberal Hernando de Soto (Avanza País) obtiveram 11,69% e 11,60%, respectivamente. Isso significa que mais de 70% dos peruanos votaram em alguém que não será o presidente do Peru. No entanto, Castillo foi o vencedor em 16 das 24 regiões do país. Fujimori, acusada de lavagem de dinheiro, venceu nas oito províncias restantes. Mais de 15% dos peruanos votaram nulo ou em branco.

No dia 6 de junho, os peruanos retornarão às urnas no que será uma batalha eleitoral entre a esquerda radical e a direita autoritária.

Quem apoia quem no segundo turno

Como consequência da forte fragmentação, o segundo lugar não havia sido definido na manhã desta segunda-feira, 12 de abril, quando De Soto ocupava o segundo lugar com cerca de 13,50%. Na ocasião, Fujimori propôs que os dois fizessem um acordo para "enfrentar o populismo e a esquerda radical" no segundo turno. “Apesar das diferenças que temos, também há grandes coincidências”, disse a candidata sobre o economista em nota à imprensa. "Não importa quem vá ao segundo turno, espero que possamos trabalhar juntos", disse.

Rafael López Aliaga, conhecido como Bolsonaro peruano, surpreendeu a todos ao declarar que apoiaria Castillo no segundo turno

Dessa forma, espera-se que De Soto declare apoio a Fujimori. López Aliaga, conhecido como Bolsonaro peruano, surpreendeu a todos ao declarar que apoiaria Castillo no segundo turno e pediu a seus partidários que fizesse o mesmo. Ele argumentou que ambos são "pró-vida e pró-família", refletindo sobre o profundo conservadorismo do candidato esquerdista em questões sociais.

“Ele capta a grande angústia de um Peru abandonado (...) há pessoas que não têm vacinas; por esses coitados, pessoas que não têm comida, [Castillo] entende essa angústia das províncias contra Lima”, disse López Aliaga.

A vingança rural contra Lima

Castillo, oriundo da humilde região andina de Chota, representa as regiões rurais do Peru, historicamente abandonadas pelos governos em relação a Lima e ao litoral, regiões urbanas e mais ricas. O vencedor do primeiro turno, um outsider de 51 anos, chegou a seu local de votação montado em seu cavalo, destacando sua origem camponesa. Castillo liderou uma campanha anti-establishment que conseguiu conquistar o voto das partes mais pobres do Peru. Dessa forma, o candidato, pouco conhecido na capital peruana, trouxe à tona o descontentamento das classes mais pobres e rurais do país – ao mesmo tempo em que destacou o peso político dessas regiões. A vitória de Castillo no primeiro turno é, antes de mais nada, uma derrota para o establishment peruano e sua classe política.

O conservadorismo venceria sim ou sim as eleições presidenciais deste ano

Castillo, defensor do governo de Nicolás Maduro na Venezuela, é favorável a amplas políticas de nacionalização de empresas dos setores de "mineração, gás, petróleo, hidroenergia, comunicações, entre outros", afirmando que o Peru deve assumir o controle dos três principais setores econômicos do país: mineração, gás e petróleo. Esta semana, Castillo, que prometeu substituir a Constituição do “auto-golpe” de Alberto Fujimori, pediu o apoio dos outros partidos no Peru e convocou "a Polícia Nacional, as Forças Armadas e o grande empresariado a se sentarem e conversarem, sem medo", para que juntos possam derrotar o fujimorismo.

Ao profundo descrédito das instituições peruanas nas últimas duas décadas soma-se a demanda por uma nova constituição que estabeleça as bases para a regeneração democrática do país, mas com essa fragmentação e com o confronto aberto entre os extremos do espectro político, será difícil alcançar o amplo consenso necessário para iniciar um processo constitucional.

Vitória dos valores conservadores

Apesar de representar valores de esquerda em questões relacionadas à economia, Castillo defende valores culturais e sociais bastante conservadores, contrariando diretrizes progressistas como a descriminalização do aborto, questões de diversidade de gênero, casamento entre pessoas LGBT+ e ampliação de direitos civis. Esses também são valores apoiados principalmente por Fujimori – assim como pelos dois candidatos que terminaram em terceiro e quarto no primeiro turno. Em outras palavras, o conservadorismo venceria sim ou sim as eleições presidenciais deste ano. “Claramente, o pensamento conservador, que também é machista e patriarcal, se saiu bem nessas eleições”, disse a antropóloga feminista Alejandra Ballón.

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