democraciaAbierta: News

6 mil indígenas celebram Lula em Brasília, mas exigem ação

Povos têm esperança de que o novo governo garanta a demarcação de terras indígenas

Tommy Greene
4 Maio 2023, 10.00
O presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva recebe um presente do chefe Kayapó Raoni Metuktire (à direita) durante a cerimônia de encerramento do acampamento indígena Terra Livre em 28 de abril de 2023 em Brasília, Brasil.
|

Andressa Anholete/Getty Images

"Implementar políticas que respeitem nossa autonomia e nosso modo de vida." Para Vanda Witoto, destacada liderança da Amazônia brasileira, esse era o objetivo central da 19º edição do Acampamento Terra Livre (ATL).

Na última semana de abril, entre cantos, danças e um apertado programa de compromissos políticos, centenas de grupos indígenas se reuniram em Brasília – no local onde apenas três meses antes da tentativa de insurreição dos partidários de Bolsonaro – para defender esses princípios.

Estima-se que 6 mil pessoas se reuniram no Distrito Federal para o fórum de seis dias, o maior encontro anual de povos indígenas do mundo, segundo a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB). Embora a edição do ano passado do ATL – após um hiato de dois anos devido à Covid-19 – tenha servido basicamente um comício pré-campanha em esforços de garantir que o então presidente Jair Bolsonaro fosse deposto nas eleições de outubro, este ano o evento focou no avanço da representação institucional histórica conquistada pelos grupos indígenas do Brasil através do governo incipiente liderado por Luiz Inácio Lula da Silva.

Entre essas conquistas institucionais estão o recém-criado Ministério dos Povos Indígenas, chefiado pela destacada ativista Sônia Guajajara, e a nomeação de Marina Silva, defensora da Amazônia, como ministra do Meio Ambiente.

Líderes indígenas disseram ao democraciaAbierta que, apesar da situação difícil, avanços importantes foram obtidos nos primeiros meses do governo Lula. “Estamos satisfeitos com o que foi proposto e com as estruturas implementadas até agora”, disse Dinamam Tuxá, coordenador da APIB e assessor jurídico de grupos indígenas de Minas Gerais, Espírito Santo e do nordeste brasileiro. "Muitas coisas foram destruídas pelo governo anterior. Estamos cientes de que a reconstrução que este país precisa agora leva tempo e, embora seja um processo lento, está acontecendo. Mas agora o que realmente precisamos é que o governo, com a máxima urgência, comece a implementar seus compromissos de políticas públicas, principalmente o reconhecimento e a demarcação dos territórios indígenas. Estamos aqui para garantir que isso aconteça."

A demarcação territorial, enfatiza Tuxá, é a "prioridade número um" para os povos indígenas do Brasil neste momento. Em janeiro, o governo atual prometeu que 14 territórios seriam legalmente confirmados para demarcação antes do ATL deste ano – uma das principais promessas de Lula aos grupos indígenas durante os primeiros 100 dias de seu governo, apesar da forte oposição esperada em um Congresso dominado por os bolsonaristas.

As instituições públicas continuam sem entender os direitos indígenas

Em seu discurso para uma multidão vibrante na sessão plenária de encerramento do ATL, Lula anunciou a criação de seis novos territórios a serem oficialmente reconhecidos pelo Estado, totalizando cerca de 6.128,6 km2 de terra.

Muito trabalho pela frente

Para cada um dos líderes indígenas com quem o democraciaAbierta, uma coisa é clara: a mera existência do governo Lula é motivo de comemoração após o ataque total aos direitos territoriais das comunidades indígenas e seus órgãos autônomos durante o mandato de Bolsonaro.

O desmatamento na Amazônia aumentou quase 60% sob seu governo, juntamente com um aumento acentuado de invasões violentas em territórios indígenas e ataques violentos contra defensores da terra. Bolsonaro também havia prometido, durante sua campanha presidencial de 2018, "dar uma foiçada" na Funai, órgão encarregados de proteger os direitos indígenas e exercer a governança em suas terras.

Esses quatro anos representaram "um dos piores momentos da história de nossas comunidades", afirmou Witoto. Após esse período, disse ele, “muitos dos primeiros esforços do governo foram direcionados, compreensivelmente, para a emergência humanitária que os Yanomami está vivendo”. Um das primeiras ações de Lula e Guajajara após tomar posse foi fazer uma visita de emergência à TI Yanomami, em Roraima. Durante o governo Bolsonaro, milhares de garimpeiros invadiram a área, principal motivo por trás da crise.

Não está tão claro, porém, como Lula conseguirá equilibrar suas promessas de proteger esses territórios frente, sua estreita margem de governança e as pressões econômicas concorrentes, entre outras considerações. Também há dúvidas sobre como Guajajara e Marina Silva poderão cumprir de seus respectivos ministérios.

Embora tenha sido importante destacar o fim dos últimos quatro anos, disse Witoto, essas comemorações antecipadas não serviram para desviar a atenção da necessidade premente de valorizar essa virada histórica nas instituições nacionais brasileiras.

Witoto disse ao democraciaAbierta que os grupos indígenas continuam precisando de "respostas mais concretas" das instituições nacionais e que, apesar da mudança no governo central, suas comunidades continuam sofrendo ameaças em várias frentes.

Há preocupações de que os ministérios de Guajajara e Marina Silva não estavam trabalhando suficientemente juntos

“Queremos que o governo se manifeste contra a construção de hidrelétricas e infraestruturas associadas em nossos territórios”, afirmou. "Queremos que o governo se posicione contra a exploração da Petrobrás na Amazônia. Queremos ver um compromisso real do Estado com nossas comunidades. É isso que queremos."

Nas semanas que antecederam o ATL, foram expressas preocupações de que os ministérios de Guajajara e Marina Silva não estavam trabalhando suficientemente juntos, apesar da sobreposição de suas competências.

“Ainda é cedo”, disse Tuxá, “mas o ministério de Sônia Guajajara tem que fazer mais para desenvolver políticas públicas efetivas com outros ministérios ao seu redor”.

Segundo Tuxá, um exemplo claro de como o novo ministério poderia servir às pessoas para as quais foi criado seria desenvolver fundos específicos para a governança e proteção dos biomas, acrescentando que: "Em última análise, o sucesso do seu ministério será determinado em grande parte pelo grau em que for capaz de reforçar a autonomia das comunidades indígenas".

Enquanto um dilúvio caía sobre Brasília no penúltimo dia do ATL, Witoto explicou que um dos principais desafios seria garantir que os ministérios recebessem recursos adequados e fossem consolidados por grupos indígenas.

"O fortalecimento das instituições democráticas – seja no ministério de Guajajara ou no nível da Funai – também deve ser uma luta fundamental para o nosso povo agora", disse. "Precisamos que essas estruturas sejam fortalecidas, que o ministério de Guajajara tenha recursos suficientes. Precisamos garantir uma reforma política transversal em áreas como educação sanitária".

"As instituições públicas continuam sem entender os direitos indígenas: historicamente, trabalharam contra nós e, por enquanto, continua assim. Por isso é extremamente importante que agora se interessem por nossos povos, por nossos modos de vida: que nos consultem e que possam avançar em um processo de construção coletiva, com nossas comunidades no centro".

We’ve got a newsletter for everyone

Whatever you’re interested in, there’s a free openDemocracy newsletter for you.

Unete a nuestro boletín ¿Qué pasa con la democracia, la participación y derechos humanos en Latinoamérica? Entérate a través de nuestro boletín semanal. Suscribirme al boletín.

Comentários

Aceitamos comentários, por favor consulte ás orientações para comentários de openDemocracy
Audio available Bookmark Check Language Close Comments Download Facebook Link Email Newsletter Newsletter Play Print Share Twitter Youtube Search Instagram WhatsApp yourData