Uma polícia cada vez mais militarizada e violenta vem matando indiscriminadamente civis – a grande maioria negros e pobres –, o que recentemente ganhou atenção internacional. A brutal matança de pessoas nas favelas de todo o Brasil, e mais notoriamente no Rio de Janeiro, pelas mãos da polícia é tão intrínseca à sociedade brasileira como o samba ou o futebol. O que mudou é que os negros estão tomando as ruas e as mídias sociais para delatar as injustiças cometidas contra suas comunidades.
O caso da morte de João Pedro Matos Pinto atraiu a atenção da mídia recentemente. Em 18 de maio, apenas uma semana antes da morte de Floyd, três policiais, supostamente perseguindo suspeitos, invadiram uma casa na favela do Salgueiro, no Rio, onde João Pedro, de 14 anos, brincava com alguns primos. Os policiais abriram fogo, atirando nas costas do adolescente. Os policiais levaram João Pedro em um helicóptero, deixando a família sem informação nenhuma sobre seu paradeiro ou condição, por mais de 17 horas.
O casa da Ágatha Félix também teve repercussão internacional. Em setembro, a menina de 8 anos e sua mãe voltavam para sua casa no Complexo do Alemão, no Rio, quando a polícia atirou na van em que viajavam, matando Ágatha.
Estes não são incidentes isolados, mas fazem parte de uma tendência ultrajante. Na última década, a polícia matou mais de 33 mil civis – pelo menos 75% deles eram negros. Aconteceram protestos, particularmente dentro das comunidades mais afetadas por essa violência, mas nada como o tumulto visto nos Estados Unidos.
Por mais dividido, desigual e injusto que seja os Estados Unidos, os negros americanos têm sido capazes de se organizar e lutar pela justiça por mais tempo, de uma forma mais coesa. Ao longo do século XX, houve revoltas significativas em Chicago em 1919, no bairro do Harlem em Nova York em 1935, Detroit em 1943 e Los Angeles diversas vezes(1943, 1965, 1992). Em quase todos os casos, a agitação havia sido desencadeada ou pela violência policial direta ou por sua relutância em intervir quando violência estava sendo cometida contra negros.
A atenção do público só começou a ganhar força no caso Floyd durante o fim de semana – vários dias depois de Derek Chauvin pressionar o joelho contra o pescoço do homem por quase nove minutos no dia 25 de maio – quando negros (e brancos) invadiram as ruas de Minneapolis e outras cidades dos Estados Unidos. A agitação social provou ser a única linguagem que a os americanos brancos parecem entender diante da desigualdade racial. Essa linguagem não foi permitida aos negros brasileiros, e isso lhes custou séculos de mortes sistêmicas, em plena luz do dia.
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