Bolsonaro legitimou o uso político dessas armas. Em célebre reunião ministerial realizada em abril de 2020, o presidente disse que gostaria de armar a população para que as pessoas possam ir às ruas “contra esses bostas”, referindo-se a prefeitos que, durante a pandemia da Covid-19, seguiam restrições de isolamento social para proteger cidadãos do avanço da contaminação. Seu argumento: “Se um bosta de um prefeito fizer um bosta de um decreto, algema, e deixa todo mundo dentro de casa. Se tivesse armado, ia pra rua.” Ou seja, para Bolsonaro, se um prefeito ordenasse um bloqueio para retardar a propagação do coronavírus os cidadãos “devem ser capazes de se defender”.
Há evidências crescentes de que muitas dessas armas de fogo facilitadas para civis estão acabando nas mãos de criminosos. Historicamente, quando a polícia brasileira apreende uma arma de um criminoso, descobre-se que omesmo criminoso possuía a arma legalmente. Mas o aumento do volume armas que circulam agora foi um grande benefício para o submundo.
Os militares são parcialmente responsáveis por supervisionar a posse de armas particulares no Brasil. Mas não conseguiram avançar na estrutura e nos mecanismos do controle e fiscalização num nível capaz de atender à crescente demanda. Isso facilitar a vida de criminosos. Após a revelação de que um homem procurado por assassinato e tráfico de drogas havia comprado um rifle automático, o Exército divulgou uma nota concisa, informando que ele tinha o direito legal de fazê-lo com base na papelada que fornecera – mas que sua permissão seria revogada.
Parece claro que estamos diante de um projeto político do governo Bolsonaro para facilitar o armamento da população, razão pela qual os militares não investiram na capacidade necessária para cumprir sua tarefa de fiscalização – uma interferência política de Bolsonaro nessa decisão.
Além disso, o ativismo pró-armas espalhou uma cultura armamentista que flerta com tentativas autoritárias e antidemocráticas. Grupos que defendem o direito amplo do indivíduo à autodefesa também flertam com posições antidemocráticas. Por exemplo, em uma reunião em junho promovida por grupos pró-armas, discursos inflamatórios questionaram o Supremo Tribunal Federal por tomar decisões desfavoráveis ao governo. E, como faz o próprio presidente, tentaram e tentam deslegitimar o sistema de votação eletrônica das eleições.
Em outras palavras, o presidente tem uma base de apoio forte e armada. E resta perguntar: eles pegariam em armas para defender seus interesses? É possível que o Brasil tenha sua própria versão daquelas cenas vistas nas eleições americanas, quando eleitores de Trump invadiram o Capitólio para deslegitimar os resultados das eleições?
Violência política e intimidação
Uma preocupação mais ampla hoje no Brasil é a violência e intimidação contra políticos e crimes com motivação política.
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