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Bolsonaro vs. povos indígenas: a Amazônia em xeque

O chamado marco temporal pode abrir um precedente perigoso não só para o Brasil, mas para toda a região

democracia Abierta
6 Setembro 2021, 12.01
Os povos indígenas brasileiros aguardam uma decisão do STF que pode decidir seu futuro
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Para Jair Bolsonaro, e para a bancada ruralista que o apoia, os indígenas da Amazônia sempre foram um estorvo e, agora que está no poder, o presidente brasileiro está implementando sua agenda para tentar liberar a passagem aos interesses extrativistas e do agronegócio.

Mas a identidade dos indígenas se baseia na resistência. Afinal, sua sobrevivência depende disso. Em 25 de agosto, milhares de indígenas se manifestaram frente ao Supremo Tribunal Federal (STF) para levantar suas vozes contra uma decisão que visa reverter as demarcações de terras em casos em que os indígenas não estivessem fisicamente em suas casas antes de 5 de outubro de 1988, dia em que foi assinada a atual Constituição e em que os povos indígenas se tornaram, pela primeira vez, sujeitos de direitos. O STF deveria ter votado no chamado marco temporal na última quarta-feira, dia 1 de setembro, mas a sessão foi suspensa até o dia 8 deste mês.

A decisão representa uma grande ameaça aos indígenas, uma vez que a comprovação da posse da terra envolve um processo administrativo que não existia necessariamente na época.

O marco temporal é um ataque legal e judicial em grande escala contra os povos indígenas no Brasil com um objetivo claro: acabar com a Amazônia

Mas a decisão também abriria a Amazônia brasileira para grandes projetos de agronegócio e para a exploração de recursos ilimitados.

Em 1º de setembro, a Suprema Corte do Brasil ouviu argumentos a favor e contra esta reivindicação às terras indígenas que, para as comunidades indígenas, são essenciais para sua sobrevivência, mas que, segundo o Presidente Bolsonaro, fazem parte da segurança jurídica dos agricultores da região.

O caso da reivindicação de terras foi acionado quando o atual governo interpretou de forma restrita os direitos indígenas a fim de expulsar a comunidade Xokleng de uma reserva natural em suas terras ancestrais.

A APIB, maior organização indígena do Brasil, disse à França 24 que a tese do marco temporal é uma tese ruralista que restringe os direitos indígenas. É também uma tese defendida por empresas e setores econômicos interessados ​​em se apropriar de terras indígenas.

A tese do marco temporal também se opõe à teoria do indigenato, consagrada na Constituição de 1988, que determina que o direito indígena à terra é originário, ou seja, anterior à formação do Estado brasileiro, independentemente de uma data específica de posse da terra e mesmo do procedimento administrativo de demarcação temporal.

Em artigo recente para o openDemocracy, Vanessa Andreoni explicou como o governo busca retirar os títulos de terras indígenas e cancelar os indígenas direitos para abrir essas áreas a empresas predatórias. Andreoni afirma, además, que "aqueles que querem prejudicar os povos indígenas estão armados, prontos e esperando um sinal do governo".

Jair Bolsonaro gesticulando
Jair Bolsonaro
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O que é indiscutível é que o marco temporal é um ataque legal e judicial em grande escala contra os povos indígenas no Brasil com um objetivo claro: acabar com a Amazônia.

A própria assessora especial para a Prevenção do Genocídio, Alice Wairimu Nderitu, manifestou preocupação com o desenvolvimento do caso no Brasil. "Na região das Américas, estou particularmente preocupada com a situação dos povos indígenas. No Brasil, Equador e outros países, eu peço aos governos para proteger comunidades em risco e garantir justiça para crimes cometidos," afirmou.

Embora os povos indígenas representem apenas 4% da população mundial, eles protegem 80% da biodiversidade do planeta, especialmente a Amazônia que atua como o pulmão e rins da Terra devido às suas funções de filtragem de carbono e regulação das correntes de água. Além disso, de acordo com um relatório de monitoramento de cinco anos da Botanic Gardens International sobre o estado das árvores do mundo, as árvores amazônicas são a espinha dorsal dos ecossistemas naturais e o maior sumidouro de carbono do mundo.

Por enquanto, povos indígenas, empresas e o próprio Bolsonaro continuam aguardando a decisão do STF, que definirá os rumos da Amazônia brasileira, que, se sofrer maior desmatamento e exploração, chegará a um ponto de inflexão sem retorno. Da mesma forma, os povos indígenas seriam despojados, vítimas do que eles mesmos chamaram de "massacre civilizado". Mas o que acontece atualmente no Brasil afeta diretamente não apenas o futuro dos povos indígenas, mas o futuro de todo o planeta.

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